Até então, eu só possuía o superficial conhecimento do Manual de Guerrilha, o qual eu ainda nem havia terminado de ler... Mas, com o Batismo de Sangue foi diferente: em 15 dias eu desconstruí e reassimilei tudo o que sabia (ou pensava que sabia) a respeito da história do Brasil na época da Ditadura Militar.
"A resistência humana tem limites nem sempre conhecidos. Ao encarnar em sua vida os ideais pelos quais lutava, Marighella conseguiu que o limite de sua resistência chegasse à fronteira em que a morte recebe o sacrifício como dom".
Em diversas passagens do livro de Frei Betto, era impossível não lembrar de algumas frases contidas no Manual de Guerrilha: "o guerrilheiro urbano defende uma causa justa, que é a causa do povo". E eu me paro pensando, refletindo sobre minhas próprias causas - perdidas ou não - quase sempre egoístas, pífias e efêmeras. Daí, para tentar aliviar essa sensação de egocentrismo eu explico para mim mesma "aqueles eram outros tempos"... mas aqui dentro, eu sei que essa desculpa não cola. E quando eu terminei de ler o Batismo de sangue, me dei conta de que o Frei Betto talvez pudesse estar correto ao colocar que "É mais fácil ser solidário às causas que às pessoas". Pra mim, há um paradoxo entre o que sinto e sou e o que eu li e aprendi, pois eu sempre defendi o ser humano e a sua humanidade, mas como ser humana diante de tantas atrocidades, tantas injustiças e tanta exploração - que até hoje atormenta o povo brasileiro? tenho total convicção de que há alguma coisa de errado com os meus ideais!
"No teatro, o último ato é o mais importante e o único no qual os espectadores são além da peça, os verdadeiros atores: o momento da saída, quando o reencontro com a realidade lá fora dá-se na visão crítica proporcionada pela arte".
E agora que terminei de ler esse livro que é muito mais que uma obra de arte - é o retrato de uma realidade - e me deparo com diferentes situações, das quais eu simplesmente ignorava. Então, eu me convenço de que é preciso (re)mexer em algumas feridas para que a cicatriz seja definitiva. Foi isso que o livro do Frei Betto provocou em mim, que sou um indivíduo frugal e até já pensou em ser advogada, mas... de quem? a quem eu quero servir? qual é o meu papel? e, novamente, eu me recordo do Manual de Guerrilha: "É melhor cometer erros atuando a não fazer nada por medo de cometer erros".
"Um revolucionário é um ser social, como uma árvore cujas raízes se espalham à sua volta, cravadas no chão da história, e cujos frutos vão muito além de seus galhos e nutrem o esforço de libertação".
Com isso eu me recordo da música e da história de Dom Quixote e me dou conta de que quiçá este personagem realmente apresente as qualidades de um guerrilheiro urbano: "que possa caminhar bastante; que seja resistente à fadiga, fome, chuva e calor;conhecer como se esconder e vigiar, conquistar a arte de ter paciência ilimitada; manter-se calmo e tranquilo nas piores condições e circunstâncias, nunca deixar pistas ou traços". Talvez ele seja chamado de otário por agir assim, mas como diria o Humberto Gessinger na canção: "tudo bem, seja o que for, seja por amor às causas perdidas, por amor às causas perdidas".
Ao final das leituras, das reflexões, das análises, das recordações, das discussões e dos pensamentos e atitudes, eu encerro este texto com uma pequena e marcante frase do Batismo de sangue que justifica toda essa minha inquietude, frustração e angústia:
"Mais importante que viver por uma causa é morrer por ela".
por: Adrielle Lopes